Dificuldades emocionais para lidar com as responsabilidades familiares e os problemas que surgem na vida podem ser um fator de aumento de peso e surgimento da obesidade entre homens, demonstra uma pesquisa do Instituto de Psicologia (IP) da USP. O trabalho também demonstra a importância de se entender os fatores clínicos e psicológicos que levam a obesidade masculina e de um trabalho de prevenção ligado a atenção para questões afetivas desde a infância.
A psicóloga Simone Conejo, autora da pesquisa, aponta que o estudo surgiu devido a escassez de material bibliográfico direcionado ao gênero masculino no que apoiassem as reflexões necessárias no atendimento psicológico de pacientes com obesidade mórbida. "Há muitos estudos sobre mulheres, crianças, adolescentes e grupos mistos, mas nada voltado especificamente para o homem", conta. Os participantes do trabalho forneceram dados para aplicação de uma escala que avalia a adaptação da pessoa nos campos afetivo-relacional, produtivo, sócio-cultural e orgânico, com uma classificação em termos de adaptação eficaz e ineficaz.
De acordo com a psicóloga, o aumento da responsabilidade na vida adulta configurou-se como um ponto de convergência entre questões da masculinidade e da obesidade. "Há uma dificuldade em lidar com as expectativas, que ainda aparece ligada ao papel idealizado do homem como provedor da família", ressalta. "Muitos homens tem dificuldades em se comunicar, falar com os outros e até consigo mesmo, sentindo-se sem apoio para lidar com as dificuldades da vida".
A pesquisadora aponta que a dificuldade de comunicação acontece também nas relações familiares. "Isso é marcado por uma sensação de 'estar só', de afastamento e dificuldade de lidar com emoções", afirma. "Assim, quanto mais a responsabilidade é percebida como um fardo, sem uma estrutura interior capaz de lidar com essa mudança, mais aumenta a tendência de obesidade".
Emoções
A pesquisa mostrou que não existe uma relação direta entre obesidade e o fato do homem ter se casado. "Alguns participantes da pesquisa só ganharam peso muito depois do casamento, ou depois da ruptura de relacionamentos importantes", explica Simone. "Existem fatores no campo emocional que interferem de modo muito mais significativo no aumento de peso e no surgimento da obesidade".
Entre os pacientes apenas com sobrepeso, a pesquisa mostrou que os homens se relacionavam melhor com as próprias emoções, e apresentavam uma psicodinâmica onde a função paterna era mais presente. "São pessoas que sabem lidar melhor com a angústia, a frustração e as dificuldades, sem usarem a comida como compensação", destaca a psicóloga.
A obesidade foi mais presente entre pacientes que apresentavam um histórico de doenças associadas a dificuldades emocionais. "Estar atento às necessidades afetivas durante o desenvolvimento infantil pode funcionar como fator de prevenção da obesidade e de melhoria de qualidade de vida".
Simone conta que uma das grandes dificuldades da pesquisa foi encontrar homens dispostos a falar voluntariamente sobre obesidade. "No início, tentaram-se contatos com os pacientes tratados em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) no interior de São Paulo, mas apenas as mulheres se mostravam interessadas em participar", diz. Apenas dois homens aceitaram fazer uma entrevista espontânea. "Os demais se esquivaram, muitos por preconceito com o trabalho do psicólogo, e queriam apenas seguir o tratamento com medicamentos". O trabalho foi orientado pela professora Kayoko Yamamoto, do IP.
Depois de publicar anúncios em jornais, sem obter retorno, a psicóloga só conseguiu encontrar pessoas suficientes para realizar o estudo em uma indústria que já fazia ações relacionadas ao controle e a prevenção de obesidade com seus funcionários. "O modo com que os homens são socializados leva-os a tratar a saúde de uma forma diferente da população em geral", aponta Simone. "Assim, as campanhas de prevenção precisam se adequar aos diferenciais dessa população masculina para serem eficazes".
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