terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Autoimunidade precoce

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – As doenças autoimunes são consideradas muito comuns, atingindo entre 5% e 7% da população mundial, mas ainda representam uma série de grandes desafios para a medicina. Uma das opções mais promissoras para fazer avançar o conhecimento sobre os processos complexos envolvidos com esse grupo de doenças – que inclui as tireoidites, o vitiligo, o lúpus, o diabetes mellitus tipo 1 e artrites em geral – é o estudo da autoimunidade em crianças.

Aproveitando os casos catalogados no Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), que tem registros de 1.200 crianças com doenças autoimunes, um grupo de pesquisadores paulistas estudará as bases moleculares e celulares da autoimunidade em crianças.

O projeto temático, que acaba de ser iniciado, é financiado pela FAPESP e coordenado por Magda Carneiro-Sampaio, professora do Departamento de Pediatria da FMUSP. Magda é também Presidente do Conselho Diretor do Instituto da Criança, onde está sendo desenvolvido o projeto em colaboração com o Instituto do Coração (Incor) e com o Hospital do Coração (HCor).

De acordo com Magda, a autoimunidade – distúrbio que leva as defesas do organismo a uma autoagressão e é a base das doenças autoimunes – é mais prevalente entre adultos. "Mas acreditamos que a manifestação de doenças autoimunes em crianças é determinada por um forte fator genético. A partir dessa hipótese, resolvemos apostar na investigação da autoimunidade de início precoce, já que temos acesso a uma grande população de crianças com doenças autoimunes", disse Magda à Agência FAPESP.

Segundo a professora, muitas das crianças apresentam mais de uma doença autoimune ao mesmo tempo, o que reforça a hipótese do fator genético. "O que o projeto tem de novo é que estamos investigando as doenças autoimunes de modo geral e não apenas uma delas", declarou.

Magda explica que o projeto tem três linhas mestras, sendo que a primeira delas é a investigação da relação entre imunodeficiência e autoimunidade. "Há evidências de que algumas imunodeficiências favorecem a manifestação da autoimunidade. A partir daí queremos chegar a estudar a questão genética", disse ela.

A segunda linha de pesquisa é o estudo do timo, órgão pouco conhecido, de acordo com Magda, mas que tem uma relação crítica com as doenças autoimunes. "Os linfócitos que nos autoagridem deveriam ser selecionados para serem destruídos no timo. Por isso muitos cientistas consideram que as doenças autoimunes são, no fundo, defeitos do timo. É crucial entender melhor esse órgão", declarou.

A terceira linha tratará, de acordo com Magda, da questão da genética das doenças autoimunes. "Escolhemos duas doenças – o lúpus e a hepatite autoimune na criança – para realizar um estudo genômico", disse.

Além dessas linhas, há outros subprojetos dentro do temático, segundo ela. "Um deles, por exemplo, prevê a formação de um grande banco de dados relacionados a todos esses grupos de doença. Um outro tratará da qualidade de vida das crianças portadoras de doenças autoimunes, estudando questões como a displidemia e impactos sobre os ossos e dentes", explicou.

Oportunidade de pós-doutorado

Para auxiliar o desenvolvimento dos trabalhos na linha de pesquisas sobre o timo, o Projeto Temático está selecionando um pesquisador com formação em imunologia e biologia celular e tecidual para uma bolsa de pós-doutorado. Mais informações sobre a vaga estão publicadas no site FAPESP – Oportunidades, em www.oportunidades.fapesp.br/pt/102.

Segundo Magda, o profissional selecionado, que terá a bolsa por 24 meses prorrogáveis por mais 12 meses, trabalhará com os estudos funcionais do timo humano. "Quando precisamos avaliar o funcionamento do fígado, podemos fazer um exame de sangue. No caso do rim, podemos fazer exames de ureia e de creatinina, por exemplo. Mas ainda não há parâmetros consagrados para o estudo do timo. Por isso é fundamental investir nessa linha de estudo funcional do órgão", disse a professora.

Segundo ela, os trabalhos serão iniciados com o estudo do timo em crianças que não têm doenças autoimunes, para estabelecer um padrão normal. Em seguida, a pesquisa passará para o segmento das crianças com cardiopatias congênitas.

"Os bebês têm um timo muito grande e ele fica bem na frente do coração. Assim por questões cirúrgicas, as crianças com cardiopatias congênitas precisam ter o timo extraído. Com isso, vamos poder não só analisar os padrões relacionados com as funções tímicas, mas, com o timo extraído dessas crianças, vamos também ter acesso ao tecido tímico para os estudos. Além disso, vamos poder estudar o que acontece com as crianças sem timo", declarou.


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