Livro analisa o desenvolvimento da economia açucareira do fim do Império até 1940 e mostra como produtores paulistas conquistaram o mercado brasileiro
Por Alex Sander Alcântara
Agência FAPESP – O Estado de São Paulo ocupa o topo da produção de açúcar no Brasil. Segundo dados da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), o Brasil produziu 31 milhões de toneladas na safra de 2008/9 e o açúcar paulista foi responsável por mais de 19,6 milhões de toneladas, ou cerca de 63% do total.
A história da cultura de cana-de-açúcar no país mostra que essa liderança foi conquistada gradativamente e somente a partir de 1940. Na década de 1910, por exemplo, o açúcar produzido em São Paulo respondia por apenas 8% da produção brasileira.
O livro Banguês, engenhos centrais e usinas: o desenvolvimento da economia açucareira em São Paulo e a sua correlação com as políticas estatais (1875-1941), de Roberta Barros Meira, analisa de que forma os engenhos e usinas paulistas se modernizaram e estruturaram seu negócio.
De acordo com autora, São Paulo, apesar de ter sido uma área secundária da produção açucareira, passou no período por uma grande mudança no setor. A compra de maquinário importado, como centrífugas de açúcar, moendas mais potentes e a construção de ferrovias – que ligavam os engenhos aos canaviais –, deram impulso na disputa pelo mercado do produto.
"Essa modernização ocorreu também no Nordeste. Mas, diferentemente de São Paulo, cujos engenhos foram montados principalmente por empreendimentos nacionais, lá houve maior participação de empresas estrangeiras, que trouxeram maquinário já defasado, visando apenas a lucros imediatos", disse Roberta, doutoranda em História Econômica pela Universidade de São Paulo, à Agência FAPESP.
O livro teve apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações. Roberta desenvolve atualmente a pesquisa de doutorado "Do terceiro distrito dos engenhos centrais às usinas", também com apoio da Fundação.
De acordo com Carlos de Almeida Prado Bacellar, do Departamento de História da Universidade de São Paulo e orientador do estudo, o livro ressalta o papel que o açúcar teve dentro da economia paulista em um período que é mais lembrado pela produção do café.
O livro é dividido em três blocos temáticos. O primeiro analisa o processo de substituição dos engenhos tradicionais (banguês) pelos engenhos centrais. O segundo aborda o nascimento das usinas na Primeira República e o terceiro foca nas políticas estatais que ajudaram a consolidar o negócio açucareiro durante o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945).
De acordo com a autora, umas das primeiras medidas para modernizar o setor se deu com a criação dos engenhos centrais no fim do Império. "Eles surgiram como forma de promover a racionalização da produção, a partir da separação da parte agrícola da parte fabril. O objetivo era separar a tarefa do fazendeiro, que seria exclusivamente agricultor, da atividade do usineiro", disse Roberta.
Mas a ideia dessas estruturas fracassou por vários problemas dentre eles a falta de mão obra especializada, de matéria-prima e necessidade de mais ferrovias ligadas aos canaviais para escoar a produção. "São Paulo saiu na frente na questão do transporte e por empregar a mesma mão de obra utilizada e que dava certo no café: o colono imigrante", disse.
Devido à forte concorrência de grandes produtores, de Cuba e da Europa (com o açúcar de beterraba), o Nordeste perdeu espaço nas exportações no fim do século 19. As exportações para os Estados Unidos – maior mercado no período – declinaram drasticamente entre 1884 e 1886, despencando de 140 mil toneladas por ano para 80 mil.
São Paulo se firmou com o crescimento do mercado interno e a produção paulista passou a interessar aos investidores estrangeiros, em especial aos franceses, que adquiriram vários engenhos centrais no período.
Sob atuação do IAA
Algumas políticas implementadas no primeiro governo Vargas foram decisivas para tentar consolidar a indústria açucareira no país, segundo a autora. Em 1933, foi criado o Instituto do Açúcar e Álcool (IAA), cuja atuação garantiu por mais tempo a hegemonia dos produtores nordestinos e conteve o avanço paulista até 1940.
"O IAA tentou regular o preço, estabelecendo cotas de produção para cada usina e para cada estado. Sob a atuação do IAA, o açúcar nordestino voltou a ser exportado. São Paulo também se beneficiou nessa época porque conseguiu vender o produto internamente a preços vantajosos, enquanto o Nordeste exportava com margem de lucro muito pequena", contou Roberta.
Entre outras medidas adotadas no governo Vargas se destacou a obrigatoriedade da mistura de 5% de álcool anidro à gasolina importada, mas o pequeno mercado automobilístico e o preço inviabilizaram os investimentos dos usineiros em destilarias.
O governo Vargas, segundo Roberta, assumiu uma postura definitiva para que o açúcar de usina fosse aceito pela população. "O açúcar produzido nas refinarias, o cristal, era consumido pela elite, enquanto a população consumia o mascavo. Mas, com o aumento na produção industrial e nos subsídios à produção, o preço do açúcar cristalizado se tornou mais acessível à população", disse.
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