O bolsista de doutorado da FAPESP Fernando Vagner Lobo Ladd, da Unifesp, ganhou o Prêmio José Carlos Prates 2009 por pesquisa que tenta entender mecanismos da doença de Huntington e os efeitos no coração dessa desordem neurodegenerativa hereditária (Foto: Divulgação)
Por Alex Sander Alcântara
Agência FAPESP – O doutorando Fernando Vagner Lobo Ladd, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ganhou o prêmio José Carlos Prates 2009, concedido pela instituição aos melhores trabalhos apresentados durante o 12º Congresso do Programa de Pós-graduação em Morfologia, realizado este mês.
O trabalho, intitulado "Cardiomiopatia induzida por ácido 3-nitropropiônico (3-NP) em camundongos – possível modelo de estudo para a doença de Huntington (DH)", foi escolhido o melhor pôster de doutorado nas categorias Anatomia, Biologia Celular, Biologia do Desenvolvimento, Histologia e Genética, entre 83 trabalhos inscritos.
O estudo tem apoio da FAPESP na modalidade Bolsa de Doutorado e está sendo desenvolvido sob orientação do professor Antonio Augusto Coppi, responsável pelo Laboratório de Estereologia Estocástica e Anatomia Química (LSSCA) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP).
A doença de Huntington (DH) é uma desordem neurodegenerativa hereditária que afeta principalmente o sistema nervoso central e atinge cerca de 50% dos filhos de pais e mães portadores da doença.
A pesquisa associa o estudo estereológico (morfológico) em três dimensões a uma abordagem multidisciplinar que envolve análise comportamental, funcional e bioquímica. O objetivo é caracterizar um modelo para se estudar os mecanismos pelos quais a DH ocasiona cardiomiopatias.
Para obter resultados preliminares, os pesquisadores injetaram em camundongos o ácido 3-nitropropiônico (3-NP), que é o modelo químico estabelecido para provocar a doença.
"Induzimos em animais o ácido nitropropiônico para quantificar o tamanho e o número total de neurônios cardíacos e de fibras musculares do miocárdio e ver se existe atrofia ou hipertrofia e, ao mesmo tempo, investigar se há redução de neurônios no sistema nervoso central", disse Coppi à Agência FAPESP.
"Nos camundongos que receberam a droga, observamos principalmente uma hipertrofia no ventrículo esquerdo do coração, seguida de um aumento na frequência e na desnervação cardíaca vagal", contou.
De acordo com o professor associado da FMVZ-USP, a ideia é tentar investigar se a droga causa alteração no coração e, simultaneamente, no encéfalo. "O objetivo é ver se esse pode ser um bom modelo para estudar a doença de Huntington", disse.
A DH é considerada uma doença neurológica – causada por uma mutação em um gene do cromossomo 4 – cujos sintomas mais frequentes são perda de células em uma parte do cérebro denominada gânglios da base (núcleo estriado), que afeta a capacidade cognitiva.
O mais marcante dos sintomas são os movimentos descoordenados do tronco e dos membros, seguidos por deficiências cognitivas (demência) e um amplo espectro de distúrbios psiquiátricos, notadamente depressão e alucinações.
"Mas estudos epidemiológicos mostram também que os problemas cardíacos são uma importante causa de morte entre os pacientes portadores da doença, estando relacionados a 30% dos óbitos entre os pacientes com DH", disse.
Abordagem multidisciplinar
Coppi ressalta que os mecanismos de comprometimento cardíaco em relação à doença permanecem desconhecidos e pouco estudados tanto clínica como morfologicamente.
Os principais achados na literatura identificam a disfunção autonômica em 44% dos pacientes portadores da DH, ou seja, um prejuízo nas atividades involuntárias do sistema nervoso periférico, envolvendo tanto o sistema simpático (excitatório) como o parassimpático (inibitório).
Segundo o pesquisador, nos pacientes com DH detecta-se um desequilíbrio na inervação cardíaca. Essa relação, aponta, estaria associada ao fato de que a destruição primária dos neurônios do núcleo estriado afeta – direta ou indiretamente – os centros autonômicos onde se origina a inervação cardíaca.
"Contudo, não se destaca uma ação direta da DH em destruir primariamente os neurônios de dentro do coração sem qualquer dependência das lesões do sistema nervoso central", disse. Neurônios não estão presentes apenas no cérebro, mas também no coração e em outros órgãos, como, por exemplo, bexiga urinária, estômago e intestinos (neurônios entéricos), entre outros.
De acordo com a Associação Brasil Huntington, atualmente cerca de 30 mil pessoas têm DH nos Estados Unidos e outras 150 mil estão em risco, mas não há dados sobre a incidência da doença no Brasil.
O próximo passo, segundo Coppi, será utilizar animais geneticamente modificados, ou seja, que já têm o gene da doença. "Vamos analisar o que acontecerá com o coração e com o encéfalo do animal e avaliar se haverá similaridade com o que esperamos encontrar com o modelo químico", disse.
O professor destaca o caráter inovador do projeto, que pretende contribuir para a explicação dos mecanismos pelos quais a DH ocasiona as cardiomiopatias.
"Os poucos trabalhos publicados na literatura médica que tentam explicar os efeitos da DH no coração realçam a importância de pesquisas experimentais que possam elucidar esses mecanismos por meio de uma abordagem multidisciplinar", disse, ao destacar a participação de outros colaboradores no estudo, entre os quais docentes da FMVZ-USP, Unifesp e da EEFE-USP.
Mais detalhes sobre a pesquisa podem ser obtidos com o professor Coppi por e-mail (guto@usp.br, skype (antonio.augusto.stereo) ou visitando o site do LSSCA (www2.fmvz.usp.br/lssca).
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